quinta-feira, 3 de março de 2022

Carta de um professor às famílias de seus alunos

 


Carta de um professor às famílias de seus alunos
Ronaldo Novaes

No Latim, a palavra "Educação" significa: nutrir, criar, educar.
Também do Latim, a palavra "Educar" significa: guiar.

Os Gregos usavam a palavra "Pedagogia" que significa "tomar pela mão, guiar no caminho". 
Para os gregos, a pessoa que era encarregada de guiar as crianças, tomando-as pelas mãos era chamada de "pedagogo".

No Século 16, os franceses passaram a usar o termo "pedagogia" como "ciência do ensino". É por isso que as professoras e professores devem ser formados em pedagogia. Antes da LDB - Lei de Diretrizes e Bases (Lei 9394 de 1996), os professores primários eram formados no "Magistério".

A palavra magistério tem origem na palavra mestre que deriva da palavra profeta, não no sentido comum de profetizar e prever o futuro, mas no sentido daquele que ensina, que professa, ou seja, declara um conhecimento. O professor não prevê o futuro, mas contribui, através do ensino, por um futuro melhor.  

Por exemplo, eu sou mestre em música e arte, portanto através do meu conhecimento, eu declaro e professo conhecimentos profundos sobre música e arte. Conhecimentos que adquiri ao longo de muitos anos de estudo. Para alcançar o título de mestre, eu passei por várias camadas de ensino (do fundamental à faculdade), me graduando e, posteriormente, me aprofundando.  

Por que o professor sempre busca a origem das palavras e sempre fala do Latim e do Grego? Porque nossa cultura tem origem nesses povos. É importante entender o significado original da palavra para ter clareza de raciocínio. Mas voltemos à pergunta inicial:  

"Por que a escola é parceira das famílias?"

A Escola é o lugar do conhecimento.
A Família é o lugar da sabedoria.
Na escola, as crianças tem oportunidade de desenvolver a sabedoria que trazem de suas famílias.

A família cria e a escola ajuda essa criação a evoluir e crescer, nutrindo com conhecimento. Em alguns casos, a escola ajuda até mesmo na nutrição, na alimentação (educar é nutrir). A família tem sonhos, projetos e propósitos e quer que a criança também se realize, encontre seus sonhos, seus projetos e seu propósito. A escola guia a criança para que alcance esse objetivos (educar é guiar). Como a criança pode alcançar seus sonhos, projetos e objetivos? Através do conhecimento.

Que tipos de conhecimento uma criança precisa? De todos os bons conhecimentos! São eles:

Conhecimento Formal:
Aquele conhecimento que precisamos ter para viver em sociedade: saber ler, saber escrever, saber pensar corretamente (cientificamente, não apenas com achismos), saber filosofar: filosofia significa amor ao conhecimento, quem sabe filosofar tem pensamentos próprios e não é apenas um gado que segue a manada. Saber a origem e funcionamento das coisas, dominar a ciência e o entendimento (saber matemático, saber artístico, saber físico e corporal, saber geográfico, saber biológico e todos os infinitos saberes que a humanidade conquistou ao longo de sua existência). 

Conhecimento Informal
Aquele conhecimento que precisamos para viver bem conosco mesmo, com nossos amigos, com nossa família: saber afetivo (aprender sobre nossas emoções e como guia-las para uma vida plena); saber social (aprender a conviver com pensamentos e valores diferentes dos nossos); saber espiritual (compreender que a vida, a existência, é um grande mistério e os outros conhecimentos não são o suficiente para vivermos a aventura da existência).

Vocês perceberam como o caminho é imenso? Perceberam como o caminho é longo e profundo?

Por mais que você ame e cuide de seu filho, você não é capaz de oferecer tudo o que ele precisa para se desenvolver. Você precisa do apoio de pessoas que dedicaram a sua vida ao conhecimento. Pessoas que se consagraram ao Saber! Essas pessoas, são os professores e eles trabalham na escola. 

Por outro lado, por mais que um professor seja dedicado e ame as crianças, nenhum professor é capaz de substituir o poder de uma família. Há coisas na vida que só podemos aprender e desenvolver em família! Eu posso oferecer o brilho nos olhos de um professor entusiasmado, mas só você pode oferecer o brilho nos olhos de um pai ou uma mãe amorosos! 

A missão é muito grande para ficar apenas com um dos lados! Essa miss
Por isso, precisamos estarmos unidos, como parceiros!

Você quer que seu filho seja feliz e tenha sucesso na vida? 
Esteja próximo de seus professores! Seja proativo participe da vida escolar de sua criança! 
Sabemos que não é fácil! Muitos de vocês trabalham o dia todo até tarde da noite. Vocês tem preocupações com dinheiro, com o futuro, com os boletos... Mas nada disso substitui o brilho do olhar do seu filho!  Por isso a escola é parceira! Para ajudar! 

Mas entenda uma coisa: a escola não cuida apenas do seu filho! A escola cuida de uma comunidade inteira! Por isso, você precisa estar presente! Estar atento, viver e reviver com sua criança esse tempo mágico da infância! 

Você mãe, você pai, você avó, avô, tio, tia, irmãos... A família nem sempre acerta e a escola também erra! Por isso não podemos jamais esquecermos dessa parceria. Caminhemos juntos! Ajudemo-nos uns aos outros! 

Meu sonho é que sua criança se realize! Alcance seus sonhos e transforme sua vida para melhor! 
Meu sonho é que o processo de aprendizado seja eficaz, agradável e feliz!
Meu sonho é que você esteja próximo à escola e vivamos todos, como uma grande família em busca de uma humanidade cada vez melhor! 

Sou o seu parceiro! 
Você sabe que pode contar comigo.
- Eu posso contar com você?

Assinado: seu querido professor!

#escola #família #parceria #professor #educação
#apm 

terça-feira, 29 de outubro de 2013


Um problema Linguístico "escondido" atrás de uma questão de Física
Por Ronaldo Novaes, mestrando em Música pela USP


Uma das maiores dificuldades e belezas de nossa Língua Portuguesa, é sua "imprecisão" científica. A Ciência, sobretudo no campo das Exatas, necessita, sempre, de termos precisos e exatos, sem dar margens à ambiguidades. Por outro lado, a Linguagem Poética, necessita desta "plasticidade" e capacidade de estar sempre aberta à novas configurações semânticas e metafóricas. E aqui consiste um dos maiores tesouros da Língua de Pessoa e Machado de Assis. 

Porém, ao não saber manusear corretamente a Língua de acordo com o "âmbito" (ou como diria Aristóteles em seu Tratado de Retórica, ao "decoro", isto é, aquilo que é adequado à ocasião ou lugar), ou seja, a Área de Conhecimento, corre-se o risco de incorrer-se em erros como o caso da "questão 82" do ENEM/2013 (observe a imagem).

Um simples "do" (em italiano, sem acento, originário da primeira sílaba do nome "Doni" - de Giovani Baptista Doni, que substituiu o termo "Ut" - por ser difícil de entoar - do Hino de São João Batista, que representa a primeira nota da escala maior natural), ao ser traduzido para Português, se transforma em "dó" (oxítona, terminada em ó, portanto, com acento), tornando-se ambígua, pois, não mais representa apenas uma frequência da escala musical,  mas pode, também, significar "comiseração", "compaixão", "pena", ou seja, dó... 

E dó é o que todos nós, professores de Música, sentimos ao ler o enunciado elaborado por alguém que, provavelmente, desconhece a nobre Arte da Música. Também sentimos dó dos estudantes que enfrentaram tal questão e estão até agora, pensando na diferença entre um "dó central" e um "dó maior", que, como diria Aristóteles, pertencem a duas Categorias distintas do Pensamento Científico. 

Fig.1: dó central (dó 3)

O primeiro termo do enunciado, chamado de "dó central", diz respeito ao "dó3", ou, como é conhecido dos pianistas, "dó da fechadura" (por estar próximo, à fechadura do piano vertical - também chamado de piano de armário), já o termo "dó maior" (erroneamente citado), diz respeito à Categoria Harmônica, ou seja, a um "acorde", formado pela primeira nota da escala (também chamada de fundamental ou tônica), em conjunto com a terça e quinta notas da mesma escala. 

Por exemplo, partindo-se de uma escala diatônica de dó maior, isto é, "dó-ré-mi-fá-sol-lá-si-dó", destacando-se a primeira, terceira e quinta notas, teremos: dó-mi-sol, ou seja, o acorde de "dó maior".



Fig.2: Acorde de dó maior (formado pelas notas dó-mi-sol)

A palavra "acorde" é assim chamada, porque tais notas, pertencendo à série harmônica (conjunto de ondas composto da frequência fundamental e de todos os múltiplos inteiros desta frequência), estão em "acordo", ou seja, estão em "harmonia". Ainda, amparado pelas Categorias de Aristóteles, poderíamos dizer que "acorde" é uma "substância", enquanto que "maior" diz respeito a quantidade. Neste sentido, "dó central" e "dó maior" pertencem a diferentes categorias, não podendo, JAMAIS, haver comparações entre si. Explico:

Como visto anteriormente, o termo "dó central" diz respeito à posição da nota no teclado, portanto, trata-se de um único som e sua respectiva posição no instrumento. Por sua vez, "dó maior", é assim chamado, "maior", por conter um intervalo de cinco semitons entre a fundamental (primeira nota da escala) e terça, isto é, dó-mi = terça maior; Enquanto, "dó menor", é assim chamado, "menor", por conter apenas quatro semitons, ou seja, um intervalo "menor" entre a fundamental (primeira nota da escala) e sua terça, isto é, dó-mib = terça menor.

Fig.3: Intervalo de terça maior - dó-mi (cinco semitons) 

 Fig.4: Intervalo de terça menor - dó-mib (quatro semitons) 

Terminologias Problemáticas

O uso do termo "dó central" diz respeito ao conhecimento "topográfico" do "tecladista", isto é, apenas instrumentistas de teclado (pianistas, cravistas, organistas), se utilizam METAFORICAMENTE do termo "central" para localizar o "dó3" da escala, em seu instrumento. 

O que significa que, para flautistas, violoncelistas, guitarristas, contrabaixistas, cantores etc. o termo "dó central" é irrelevante para a localização da nota. No entanto, esses músicos, já acostumados com as metáforas e analogias do metiê (ofício), sabem que o "dó central" diz respeito ao "dó3", podendo localizá-lo facilmente em seus respectivos instrumentos. O mesmo não ocorre no pensamento de um estudante, sobretudo, um aluno que nunca tenha estudado música - como é o caso da imensa maioria dos alunos que prestaram a prova do ENEM.

Nesse sentido, o enunciado mais adequado, deveria conter apenas os termos "dó3"  e "dó4" (próxima nota - no lugar do equívoco "dó maior"), pois, ao se valer do termo "dó central" (fazendo referência ao piano), exclui-se uma gigantesca parte da população que, talvez, nunca tenha tido a oportunidade de ver um piano de perto. Outro erro, já explicado, é a contraposição de Categorias distintas: comparação de intervalos melódicos (oitavas) com termos harmônicos (dó maior). 

Finalizando, o candidato que venha a se sentir prejudicado pela ambiguidade e erro da questão 82 do ENEM, pode, perfeitamente, partindo dos pressupostos aqui apresentados, solicitar que a mesma seja desconsiderada ou anulada. 

Indo um pouco mais além...

O equívoco demonstra a urgente necessidade de se levar a sério a proposta de Ensino de Música nas Escolas, não de forma, meramente, "lúdica" ou "intuitiva", como se vê em muitas propostas, ou, pior, como muitos dos nobres colegas pensam o professor de Música um mero "animador" de festas do calendário escolar. Além disso, pode servir como estímulo para que professores de Música, Física e Língua Portuguesa, debatam com seus alunos, as questões concernentes a tais matérias, enriquecendo-os nos que tange aos diversos saberes envolvidos.

Fica aqui, minha singela contribuição ao tema. 
Prof. Ronaldo Novaes (mestrando em musicologia)

quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Novo artigo publicado


Revista hodie vol 12 from Ronaldo Novaes

Abrimos o ano de 2013 com uma nova publicação sobre o pensamento retórico do compositor paulista, André da Silva Gomes. O artigo está disponível para o público apela Revista Música Hodie, criada pelo Programa de Pós Graduação em Música da Universidade de Goiânia (UFG), sendo um dos mais importantes periódicos na área da música. Como sempre, disponibilizamos para nossos leitores o artigo na íntegra. Não deixe de comentar!